Anais do Encontro Regional Nordeste da ABRAPSO
VOL. VII, 2021
PSICOLOGIA SOCIAL & LUTA ANTIRRACISTA: REFLEXÕES E ESTRATÉGIAS ÉTICO-POLÍTICAS A PARTIR DA INTERSECCIONALIDADE
ISSN 2965-226X
PSICOLOGIA SOCIAL & LUTA ANTIRRACISTA: REFLEXÕES E ESTRATÉGIAS ÉTICO-POLÍTICAS A PARTIR DA INTERSECCIONALIDADE
ISSN 2965-226X
Samuel Conselheiro Germano do Nascimento, Hélvia Monique Modesto dos Santos, Cauê Assis de Moura, Marcos Ribeiro Mesquita
Resumo: Dentre as numerosas inovações trazidas durante o século XXI nas mais diversas redes de relacionamento e socialização, sem dúvidas, a internet e os aparelhos digitais são encarados como adventos que modificaram diretamente a maneira como grande parte da população se comunica, armazena dados e registra informações sobre a cultura. O táxi, as lanchonetes, o cinema, são alguns dos exemplos rápidos de coisas que nos relacionamos de maneira diferente do que há cinco, seis anos atrás. A partir desses tensionamentos provocados através dessa inserção, as mídias digitais serviram como dispositivos para que assuntos anteriormente tidos enquanto verdades absolutas, fossem desmentidos e ganhassem uma ampla linha de questionamentos e questionadores. Discursos ampliados e capturados por vários sujeitos. As mídias digitais expandiram espaço para que pessoas anteriormente impossibilitadas de ocupa-los pudessem falar da sua maneira sobre suas experiências. A partir disso, assuntos como gênero, raça, sexualidade, regionalidade, capacitismo, dentre outras pautas tidas como tabus, passaram a ser amplamente debatidas. Dentre estas, as questões étnico raciais ganharam amplo debate nacional, dando seus primeiros passos a partir de blogueiras negras que falavam sobre questões de estética, cabelo black e o porquê assumir os cachos. Atualmente não é difícil encontrar em qualquer mídia digital, pessoas ou grupos debatendo os mais diversos assuntos que entrecruzam as nossas experiências diárias a partir da ótica étnico racial. Olhares múltiplos que ampliam as análises sobre o mundo e tensionam novos ordenamentos políticos dentro e fora dos movimentos sociais. Entre essas vozes encontra-se Spartakus Santiago, influencer digital, homem negro gay nordestino que debate sobre a cultura pop trazendo sempre as discussões étnico raciais em suas análises sobre o mundo. O processo de colonização deixou marcas não só arquitetônicas, como também na forma em que subjetivamos nossas experiências e nos relacionamos. O processo de escravização e genocídio de pessoas negras e indígenas nos deixou enormes feridas, dentre estas, o epistemicidio, investimento colonial de apagamento das narrativas negras e indígenas no processo de construção da ciência ocidental. Essa engrenagem subalterniza narrativas em detrimento de outras, estabelecendo lugares absolutos para verdades que auxiliam grupos hegemônicos a deterem poder, estabelecer lugares de controle. Analisar o canal de Spartakus Santiago é contrariar esse investimento, ampliando para o campo acadêmico vozes historicamente retiradas. Para isso, assistimos os vídeos presentes em seu canal, e a partir disso, cada pesquisador/a construiu sua playlist constando os temas: negritude, política, mídias digitais e sexualidade, dentre outros que nos tocam de alguma maneira. À medida em que surgiram vídeos nas quatro playlists, tornaram-se imediatamente os vídeos finais. Mediante nova consulta, definimos os 15 vídeos que iriam compor definitivamente a análise. Além das produções, realizamos leituras de autoras e autores negras/os que debatem sobre os temas presentes nas produções do youtuber, além de construirmos textos livres sobre o nosso encontro com as obras. Movimentos dessa magnitude são sempre difíceis, já que representam o questionamento de estruturas que se esforçam década após década, em manterem-se na hegemonia. Diante disso, o próprio processo de pesquisa apresentou-se como uma dificuldade. Analisar narrativas negras ocupando um lugar de similaridade, faz com que sejam possíveis novas concepções de como a contemporaneidade está estabelecida. Lidar com isso, é se deparar com a colonialidade e a forma cruel que ela perpassa as existências, sobretudo negras e indígenas, acionando lugares dolorosos que pareciam comuns somente a nós. Entretanto, esse contato provoca também o encontro das vozes, nos apresentando maneiras de desmantelar essa organização e apresentar novas formas de construir o mundo e as relações, não só nos fortalecendo, mas fortalecendo as/os nossas/os, de maneira individual e coletiva. Um aprendizado vivente do aquilombamento. O movimento realizado a partir desse trabalho possibilita um raqueamento político do sistema de produção científica, em outras palavras, a invasão e o convite para modificação do modelo que por muito serviu como instrumento teórico legitimador de mortes e exploração aos corpos negros e indígenas. Nos termos tecnológicos, um malware (algo intruso e malicioso no sistema) científico, produzido por um grupo de pessoas negras, partindo de autoras e autores pretas/os, analisando experiências de outro sujeito negro. Atitude política e desobediente contrária as verdades que favorecem a narrativa cis-heteronormativa-branca da qual pretende-se hegemônica e absoluta. Dentre os aprendizados já mencionados, a análise ao canal de Spartakus Santiago nos possibilita o encontro com cosmovisões sobre como se dá a construção da representação de pessoas negras nos mais diversos espaços e a subalternidade (objetificação do corpo, pessoas raivosas, essencialmente mão de obra, sem capacidade intelectual, criminosas). Essas figuras imagéticas discursivas influenciam também nas relações afetivo-sexuais, nesse caso, homossexuais, discurso possível de ser acessado nas provocações elucidadas a partir das produções de Spartakus. A partir disso, a análise dos discursos de Santiago nos traz a urgência em utilizarmos nossos lugares para construção e evocação de narrativas contra hegemônicas, antirracistas e anticapitalistas, propiciando espaços de reconhecimento e pertencimento.
Palavras-chave: Culturas Digitais; Juventudes; Política.