Anais do Encontro Regional Nordeste da ABRAPSO
VOL. VII, 2021
PSICOLOGIA SOCIAL & LUTA ANTIRRACISTA: REFLEXÕES E ESTRATÉGIAS ÉTICO-POLÍTICAS A PARTIR DA INTERSECCIONALIDADE
ISSN 2965-226X
PSICOLOGIA SOCIAL & LUTA ANTIRRACISTA: REFLEXÕES E ESTRATÉGIAS ÉTICO-POLÍTICAS A PARTIR DA INTERSECCIONALIDADE
ISSN 2965-226X
Victor Hugo da Silva Santos
Resumo: Os jogos digitais estão presentes dentro do cotidiano do brasileiro. De acordo com a pesquisa realizada pela Newzoo, em 2021, o Brasil representa o 12º maior mercado de jogos digitais do mundo e o primeiro da América Latina. Com a pandemia de COVID-19, o consumo de jogos digitais se intensificou, sobretudo por conta do isolamento social. Segundo a Pesquisa Games Brasil 2021, em 72% dos brasileiros consomem jogos digitais (majoritariamente por meio de smartphones) e dentre estes jogadores, 75,8% relataram que passaram a jogar mais devido a pandemia. Esta pesquisa também aponta que as mulheres são maioria, representando 51,5% de todos os jogadores, esse percentual aumenta para 62,2% quando se trata de jogos para celulares. Já no caso dos consoles e jogos para computador, os homens estão mais presentes, com 61,9% e 59,6, respectivamente. Além disso, os jovens, entre 20 e 29 anos, são os principais consumidores, computando 41,1%. Historicamente, no entanto, os jogos digitais sempre estiveram dominados pelo público masculino. Desde a criação dos primeiros jogos digitais, na década de 1980, a indústria dos jogos digitais (especialmente os consoles) foi construindo um público característico por meio dos personagens representados nos jogos e das narrativas com conteúdo violento e sexista. Estórias cujo enredo focavam em violência, agressividade, músculos, armas, guerras e lutas possibilitaram que os homens se identificassem com o conteúdo que os jogos digitais produzidos pela indústria de entretenimento, tornando-os o público-alvo. Os enredos apresentados nos jogos digitais também reduziam o papel feminino a mulheres frágeis destinadas a serem resgatadas por um herói, enquanto que na maior parte deles, as pesssoas LGBTQIA+ eram invisibilizadas ou eram representadas de forma caricata e pejorativa com o objetivo de servir como chacota ao longo da história. Essa composição de público contribuiu para a constituição de uma cultura de jogos tóxica (marcada por expressões de ódio, preconceitos, LGBTQIA+fobia e misoginia). Desta forma, a maioria das narrativas dos jogos digitais acabaram privilegiando o padrão de masculinidade hegemônica na sociedade (homens cisgêneros, heterossexuais, brancos, musculosos, que utilizam da violência para resolver seus conflitos e protegem as mulheres, as quais são vistas como prêmios sexuais a serem conquistados). Esses jogos reforçam as dinâmicas sociais opressoras de gênero e sexualidade presentes na sociedade, fortalecendo que homens e mulheres devem seguir padrões de comportamento de acordo com o esperado com os seus respectivos gêneros. Ressalta-se que a masculinidade é uma configuração de práticas em torno da posição dos homens na estrutura das relações de gênero, sendo efetivada por meio da dinâmica relacional entre os homens e com as mulheres. Neste sentido, é mais coerente pensar em masculinidades, uma vez que em uma sociedade existem várias formas de compreensão do que é ser homem. Entretanto, as várias formas de masculinidade encontram-se a margem da masculinidade eleita como hegemônica. Por sua vez, este modelo de masculinidade dominante está alinhado com o modelo de cisheteronormatividade, o qual considera que o homem deve compulsoriamente ser cisgênero e heterossexual. As masculinidades que fogem ao padrão hegemônico sofrem punições com o objetivo de reforçar o padrão a ser seguido pelos homens na sociedade. Assim, os homens são incentivados a serem fortes, corajosos, viris e não demonstrar sentimentos características opostas às que as mulheres são incentivadas. Os homens que não correspondem ao padrão socialmente esperado sofrem violências físicas e psicológicas. Nos jogos digitais, as masculinidades destoantes da hegemônica, na maioria das vezes, são retratadas de forma inferiorizada ou não representadas, invisibilizando outras formas de ser e estar no mundo. O padrão de masculinidade hegemônico reificado pelos jogos digitais contribuiu para que as minorias fossem menos representadas e estivessem mais vulneráveis a, principalmente por meio de comportamentos tóxicos dentro da cultura de jogos digitais. O preconceito e as práticas discriminatórias contra minorias visam a manutenção das normas sociais e das dinâmicas intergrupais, garantindo a dominância do padrão de masculinidade hegemônica exercida por homens heterossexuais em detrimento de outras experiências de masculinidades e feminilidades, atingindo principalmente homens não heterossexuais e mulheres. Ainda assim, os jogos digitais representam campos em disputa uma vez que mulheres e pessoas LGBTQIA+ tem reivindicado locais na construção da cultura de jogos digitais. Samira Close, Rebeca Gamer e Bryanna Nasck, por exemplo, são nomes de jogadoras que tem ganhado destaque no ramo de streaming de jogos, visibilizando a luta de mulheres e pessoas LGBTQIA+. Concomitantemente, a indústria de entretenimento tem aberto possibilidades de representações femininas emponderadas Lara Croft (Tomb Rider), Jill Valentine (Resident Evil), Aloy (Horizon Zero Dawn), por exemplo e de personagens LGBTQIA+, como Ellie (The Last of Us), Jacob Frye (Assassin's Creed Syndicate), Kung Jin (Mortal Kombat X). Porém, na maioria das vezes, os jogos ainda conservam elementos, como a hipersexualização dos corpos femininos e invisibilização dos relacionamentos afetivos e sexuais dos personagens LGBTQIA+, ficando restrito aos diálogos que fazem alusão à sexualidade ou identidade de gênero.
Palavras-chave: Cisheteronormatividade; LGBTQIA+, Mulheres; Preconceito.