Anais do Encontro Regional Nordeste da ABRAPSO
VOL. VII, 2021
PSICOLOGIA SOCIAL & LUTA ANTIRRACISTA: REFLEXÕES E ESTRATÉGIAS ÉTICO-POLÍTICAS A PARTIR DA INTERSECCIONALIDADE
ISSN 2965-226X
PSICOLOGIA SOCIAL & LUTA ANTIRRACISTA: REFLEXÕES E ESTRATÉGIAS ÉTICO-POLÍTICAS A PARTIR DA INTERSECCIONALIDADE
ISSN 2965-226X
Cauê Assis de Moura, Hélvia Monique Modesto dos Santos, Samuel Conselheiro Germano do Nascimento, Marcos Ribeiro Mesquita
Resumo: A internet pode ser apontada como uma das grandes transformações em curso no cenário contemporâneo, onde principalmente as/os jovens, passam a ter a possibilidade de produzir, reproduzir, compartilhar fatos e ideias, possibilitando a amplificação de narrativas silenciadas pelas mídias tradicionais. Assim, as/os jovens, ocupam este espaço e utilizam principalmente as mídias digitais para tornar públicas narrativas plurais e intensificar a discussão de pautas que estão no centro dos debates atuais, como as questões étnico-raciais, de gênero e sexualidade. Dentro deste contexto, a pesquisa teve o objetivo de buscar compreender como as narrativas construídas pela youtuber Rosa Luz corroboram para a constituição de discursos contra hegemônicos no cenário de conservadorismo atual. Rosa apresenta-se como travesti, negra, moradora da periferia de Brasília e utiliza o seu canal no Youtube para tornar público um discurso muito antenado com as questões que lhe afeta diariamente: o racismo, a transfobia, o sexismo, assim como visibilizar sua produção artística que passa pela performance, pelas artes visuais e pelas músicas de rap. O canal foi criado por ela em 2016 e atualmente conta com mais de quarenta mil inscritos. Para a construção da pesquisa utilizamos uma metodologia qualitativa que teve como base uma epistemologia que inclui o pessoal e o subjetivo como parte do discurso acadêmico, rompendo assim com a neutralidade entre sujeito e objeto de pesquisa. Desta forma, inicialmente realizamos uma revisão bibliográfica com intuito de analisar a relação das/os jovens com as mídias digitais. De forma paralela foi feita uma busca desde os primeiros vídeos do canal Barraco da Rosa que foram lançados em 2016 até chegar aos vídeos atuais, mantendo-se um acompanhamento semanal das novas publicações. Esses passos iniciais tiveram como objetivo construir um estreitamento de laços com o conteúdo produzido por Rosa Luz e um aprofundamento nas discussões acerca das culturas digitais. As escolhas dos vídeos que compuseram as análises da pesquisa foram feitas em conjunto, cada uma/um, individualmente, criou uma lista com 15 vídeos que julgava importante, depois em grupo observamos os vídeos que se repetiram e debatemos a relevância de cada um deles, tendo como critério o objetivo da pesquisa. Por fim constituímos uma playlist com os vídeos selecionados e elaboramos três pontos para nortear o percurso da análise. São eles: 1. Narrativas de si e a representatividade, 2. Interseccionalidades e 3. Politica e discursos contra hegemônicos. No decorrer da pesquisa foi possível compreender que Rosa utiliza o Youtube como espaço para reafirmar o local político ocupado pelo seu corpo, produzindo rupturas nas imagens hegemônicas acerca dos corpos trans/travesti e suas interseccionalidades, colocando no centro uma narrativa não mais determinada por uma posição subalternizada, mas caracterizada pela afirmação da existência. Trabalhar com a análise de conteúdos disponibilizados por meio das mídias digitais nos impõe o desafio de lidar com um material fluido, dinâmico, que exige um acompanhamento contínuo e demanda reelaborações durante o percurso de pesquisa. No mês de maio de 2020 Rosa Luz desativou todas as suas contas e colocou todos os seus vídeos do Youtube no modo privado, durante este tempo realizamos uma busca dos conteúdos que ela havia construído em parceria com outros canais e que ainda estavam disponíveis. Depois de quase dois meses ela retornou a plataforma e publicou um vídeo relatando que havia sofrido ameaças de morte proferidas por conservadores de extrema direita. Ela explicou que as intimidações surgiram após o lançamento de um single que denunciava o racismo no mercado da música brasileira e que tinha na capa uma arte em que ela segurava a cabeça decapitada de um homem branco, que foi automaticamente associada ao Presidente da República. Assim, fica nítido que em um país como o Brasil, que ocupa a primeira posição no ranking de números de assassinatos cometidos contra a população trans no mundo, onde jovens negros são diariamente assassinados e discursos conservadores de cunho preconceituoso são propagados como política de Estado, um canal como o de Rosa Luz, afronta , incomoda e por isso sofre tentativas de ser silenciado. De forma que foi possível visualizar e consideramos importante destacar o fato de que os espaços digitais não estão livres dos preconceitos que permeiam o mundo off-line, as opressões se entrelaçam em suas redes virtuais. Este não é um local dado, mas um campo em disputa atravessado por inúmeras tensões. Vozes como a de Rosa que rompem com silenciamentos, que se levantam contra um conservadorismo vigente e sobretudo amplificam possibilidades de existência de corpos que cotidianamente são colocados em locais de marginalização, proporcionam costuras possíveis de discursos contra-hegemônicos e críticos em um momento em que isso não só é necessário, como fundamental para a manutenção da nossa democracia.
Palavras-chave: juventudes; política; culturas digitais.