Anais do Encontro Regional Nordeste da ABRAPSO
VOL. VII, 2021
PSICOLOGIA SOCIAL & LUTA ANTIRRACISTA: REFLEXÕES E ESTRATÉGIAS ÉTICO-POLÍTICAS A PARTIR DA INTERSECCIONALIDADE
ISSN 2965-226X
PSICOLOGIA SOCIAL & LUTA ANTIRRACISTA: REFLEXÕES E ESTRATÉGIAS ÉTICO-POLÍTICAS A PARTIR DA INTERSECCIONALIDADE
ISSN 2965-226X
Suzana Santos Libardi, Leonardo Barros Soares, Alana Gabriela Barros Doia da Silva
Resumo: Este trabalho discute a questão do território em contextos indígenas no Nordeste do Brasil, considerando a perspectiva das crianças sobre tal problemática. Partimos de uma reflexão sobre território enquanto um lugar de entrecruzamento de fluxos políticos, culturais, geográficos, econômicos e espirituais, marcado pelas relações de poder entre os atores que o habitam, e que abarca o entendimento de Terras Indígenas simultaneamente como uma categoria administrativa do estado brasileiro e uma categoria vivencial para seus atores concretos. No Brasil, a população indígena é marcadamente jovem, apresentando um enorme contingente de crianças. A geração da infância é tomada neste trabalho como um grupo social que representa uma população definida a partir de critérios etários e também sociais - como classe, raça, etnia, gênero, dentre outros. Nesse sentido, nosso trabalho se localiza no âmbito das discussões empreendidas pela psicologia social e a antropologia da infância que enfatizam o caráter radicalmente histórico e localizado das múltiplas infâncias possíveis, para além de qualquer essencialismo biologizante, transcultural e homogeneizante. Apresentamos pesquisa de campo realizada em 2019 com crianças Kalankó, povo indígena localizado no sertão do estado de Alagoas que luta pela demarcação do seu território. As oficinas foram realizadas em 11 encontros presenciais de frequência quinzenal que envolveram um grupo de 21 crianças, com idades entre 2 e 12 anos. As oficinas se constituíram em espaço de fala e escuta sobre a vida na aldeia e o olhar das crianças sobre seu território. Para isso, planejamos atividades que envolvessem crianças participantes de várias idades, utilizando recursos metodológicos diversos para contemplar o objetivo proposto. Cada oficina contou com uma atividade grupal realizada em cada encontro, com um tema específico, por exemplo: minha família, os locais preferidos da aldeia, as brincadeiras no território, dentre outras. São exemplos de atividades: elaboração de desenhos direcionados, criação do mapa afetivo, caminhadas e livre brincar com as crianças. Algumas estratégias metodológicas, como uso de diários e outros instrumentos escritos, foram pouco produtivos, pois percebemos que algumas crianças sentiam vergonha frente, provavelmente, a uma suposição de que a equipe da universidade fosse avaliar seu desempenho. Simultaneamente, percebemos que as caminhadas, tendo as crianças como guia, proporcionavam os melhores momentos de diálogo e integração das crianças para conosco - pesquisadores não indígenas. Durante esse processo, uma das dificuldades foi lidar com o precário apoio da universidade para a execução do projeto em área afastada o que era compensado pelo apoio fundamental das lideranças locais e equipe da unidade básica de saúde indígena que cedeu o espaço para nossos encontros serem iniciados. Por outro lado, a interação dos pesquisadores com sujeitos localizados dentro da categoria infância pertencentes ao povo Kalankó fugindo de abordagens convencionais em prol de uma escuta de indivíduos comumente silenciados no âmbito da hierarquia geracional estabelecida na interação com os adultos - proporcionou um manancial de reflexões que merecem aprofundamento posterior. A partir do campo, pudemos adentrar de forma mais aprofundada na importância do elemento territorial para a construção de suas formas de ver e experimentar o mundo. Observamos que as crianças revelam consciência da disputa sobre o território vivido e sinalizam como tal realidade incide sobre seu cotidiano. Além da limitação do uso da área, que é reivindicada pelos Kalankó, foi interessante perceber o papel central da luta pela terra na construção da identidade étnica pelas próprias crianças. Os resultados sinalizam a relevância do território para o entendimento psicossocial dos marcadores geração e etnia, destacados no estudo com crianças indígenas. Ademais, é forçoso reconhecer a importância do entendimento do papel dos conflitos nesse caso, fundiários - para a conformação da subjetividade dos sujeitos participantes da pesquisa. Com o trabalho buscamos contribuir, no campo da psicologia social, para um olhar interseccional à questão geracional, bem como a consolidação do compromisso com a luta dos povos originários frente a questão agrária brasileira, e suas formas de expressão no Nordeste.
Palavras-chave: crianças indígenas; território; sertão.