Anais do Encontro Regional Nordeste da ABRAPSO
VOL. VII, 2021
PSICOLOGIA SOCIAL & LUTA ANTIRRACISTA: REFLEXÕES E ESTRATÉGIAS ÉTICO-POLÍTICAS A PARTIR DA INTERSECCIONALIDADE
ISSN 2965-226X
PSICOLOGIA SOCIAL & LUTA ANTIRRACISTA: REFLEXÕES E ESTRATÉGIAS ÉTICO-POLÍTICAS A PARTIR DA INTERSECCIONALIDADE
ISSN 2965-226X
José Fernando Andrade Costa
Resumo: O presente trabalho problematiza a introdução da temática relações raciais na formação em Psicologia a partir da experiência de reforma curricular de um curso de graduação. Alguns desafios surgiram na experiência de institucionalização do tema Psicologia e Relações Raciais no Projeto Político Pedagógico. Esses desafios podem ser apresentados na forma de perguntas reflexivas e de alguns aprendizados que merecem ser compartilhados. Primeiro, podemos questionar: Por que é relevante introduzir o tema relações raciais na formação em Psicologia? Devem ser criadas disciplinas específicas ou a temática é transversal ao curso como um todo? Há respaldo institucional, tanto no campo científico quanto no campo profissional para que essa temática seja introduzida no Núcleo Básico da formação? Essas perguntas são respondidas com base na experiência de atuação na Comissão de Reforma Curricular de um curso de graduação em Psicologia de uma Universidade Pública do estado da Bahia. A Comissão foi instituída em 2019 e, desde então, está trabalhando na atualização do Projeto Pedagógico do Curso. Em consonância com a LDB, acerca da formação em nível superior, propomos que o tema das relações étnico-raciais possui relevância acadêmica, técnica, institucional e política para a formação em Psicologia, pois é um aspecto-chave para a compreensão das características definidoras da população brasileira (sua identidade, cultura, comportamento etc.) e para a construção de uma sociedade democrática, baseada na defesa dos direitos humanos e no enfrentamento do racismo. O racismo atravessa todas as relações, produz desigualdades e privilégios e, embora o tema das relações raciais seja objeto de estudo e intervenção do pensamento psicológico brasileiro desde o final do século XIX, o desenvolvimento sistemático de um campo de produção e debate teórico e técnico sobre o assunto vem se consolidando rapidamente apenas nas últimas décadas (CREPOP, 2017). Entre os fatores relevantes para o crescimento consistente desse campo estão: a promulgação da Lei 10.639/2003, complementada pela Lei 11.645/2008, que estabeleceu a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena na Educação Básica; adoção de ações afirmativas de cotas sociais e raciais para ingresso no Ensino Superior; a instituição do Estatuo da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010); Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN), entre outras medidas institucionais e debates públicos sobre o enfrentamento do racismo. No âmbito da Psicologia, enquanto ciência e profissão, também houve crescimento contínuo e consistente de publicações sobre relações étnico-raciais, bem como o debate sobre a inserção dessa temática nos diversificados espaços de atuação (CREPOP, 2017). Considerando que o preconceito racial humilha e a humilhação social faz sofrer, o Conselho Federal de Psicologia, zelando pelos princípios do Código de Ética Profissional, publicou a Resolução n° 18/2002 que estabelece normas de atuação para psicólogas(os) em relação ao preconceito e à discriminação racial. Trata-se de um documento normativo que surge da necessidade de reforçar o combate ao racismo na prática de psicólogas(os). Por isso, a formação em psicologia deve contribuir para melhor compreensão, enfrentamento e superação do sofrimento produzido pelo racismo, além de colocar toda sua teoria e técnica a serviço da potencialização de novas formas de sociabilidade e individualização capazes de promover a igualdade racial por meio de uma postura antirracista. Não basta não ser racista, é necessário romper possíveis pactos de omissão e cumplicidade com o mito da democracia racial e garantir uma formação crítica e abrangente sobre relações étnico-raciais e, sobretudo, sobre a população negra. O Conselho Regional de Psicologia da 3ª Região também tem reunido e acumulado debates sobre a inclusão da temática no âmbito da formação e da atuação profissional. Em 2017, após a realização de um Seminário Temático, foi produzida a Carta de Salvador contendo diversas recomendações para as Instituições de Ensino Superior. Soma-se a esses debates o interesse de estudantes acerca da construção de uma Psicologia efetivamente preocupada com o enfrentamento do racismo. Ademais, o interesse pela temática é coerente não apenas com a observação dos atravessamentos étnico-raciais na vida cotidiana da população baiana, mas também com os debates mais abrangentes da sociedade contemporânea que tem paulatinamente assimilado contribuições técnico-científicas de diferentes áreas, com especial importância para a psicologia, acerca do enfrentamento ao racismo. Por isso, construir um Projeto Político Pedagógico explicitamente comprometido com uma formação em Psicologia para a compreensão crítica das relações étnico-raciais e, consequentemente, o enfrentamento ao racismo significa considerar as especificidades da população brasileira, em geral, e baiana, em particular.
Palavras-chave: Formação; Relações Raciais; Psicologia